Esta medida era apresentada como excecional e delimitada no tempo: durante o período de vigência do Programa de Assistência Económica e Financeira a que o país está sujeito devido à falta de solvabilidade das contas públicas bem como à incapacidade de o Estado português se financiar no mercado a uma taxa de juro comportável. Esta situação de emergência nacional justificava, no entender do Governo, uma medida que contribuiria significativamente para a redução da despesa do Estado nesta fase de consolidação orçamental. As razões invocadas para justificar a medida já foram suficientemente escrutinadas, concordando ou discordando delas.
Esta e outras medidas de redução da despesa foram acordadas entre o Estado português e as instituições internacionais que o financiam: a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional, vulgo Troika, e visam o cumprimento de metas estabelecidas no que se refere ao controlo do défice e à consolidação orçamental.
Convém também referir que foi o Governo do PS, liderado por José Sócrates, que acordou com a Troika a redução do défice para 4,5% do PIB em 2012 e para 3% em 2013, prevendo poder regressar aos mercados em 2014. Não se entende, por isso, a falta de coerência e a demagogia dos socialistas quando sugerem ao Governo que peça mais tempo para o necessário ajustamento orçamental. Reduzir tão significativamente o défice só pode fazer-se através da redução da despesa ou do aumento das receitas arrecadadas pelo Estado, exigindo sempre esforços aos cidadãos que reconhecidamente já são, para alguns, muito significativos. E o Governo está empenhado em reforçar a credibilidade internacional de um Portugal capaz de honrar os seus compromissos e de, com esforço e determinação, mas também com sacrifício e solidariedade em nome das gerações mais novas, conseguir atingir as metas do défice público acordadas.
É
certo que os funcionários públicos reclamavam falta de equidade na distribuição
dos sacrifícios. Chamado a pronunciar-se sobre a constitucionalidade da medida,
o Tribunal Constitucional considerou que ela violava o princípio da igualdade
(consagrado no artigo 13.º da Constituição) pelo que, mesmo reconhecendo “que
estamos numa gravíssima situação económico-financeira, em que o cumprimento das
metas do défice público estabelecidas nos referidos memorandos de entendimento
é importante para garantir a manutenção do financiamento do Estado”, propõe que
“tais objetivos devem ser alcançados através de medidas de diminuição de
despesa e/ou de aumento de receita que não se traduzam numa distribuição de
sacrifícios excessivamente diferenciada” e que haja “equidade e justiça na
repartição desses sacrifícios” (In
Acórdão 353-2012, de 5 de julho, p. 32).
Atendendo,
porém, à necessidade de o país continuar a beneficiar de financiamento externo,
o Tribunal Constitucional considera que o cumprimento do valor orçamental de
4,5% do PIB para 2012 se revela, por isso, “um objetivo de excecional interesse
público” (idem, p. 33), pelo que, encontrando-se a execução orçamental de 2012
já em fase avançada e por crer que a declaração de inconstitucionalidade, sem
mais, poderia levar ao incumprimento das metas fixadas, o que poria em perigo a
manutenção do financiamento acordado e a consequente solvabilidade do Estado, o
Tribunal Constitucional restringiu os efeitos da declaração de
inconstitucionalidade, passando a aplicar-se a partir de 2013, já que o
montante da poupança líquida da despesa pública com esta medida “assume uma
dimensão relevante nas contas públicas e no esforço financeiro para se atingir
a meta traçada, pelo que dificilmente seria possível, no período que resta até
ao final do ano, projetar e executar medidas alternativas que produzissem
efeitos ainda em 2012, de modo a pode alcançar-se a meta orçamental traçada”
(idem, ibidem).
Na
prática, este Acórdão obriga o Governo a redefinir estratégias e medidas
conducentes à consolidação orçamental a partir de 2013 que substituam a verba
que esperava arrecadar com a suspensão dos subsídios de férias e de Natal da
administração pública, mas dispensa o Governo da aplicação da medida inscrita
no Acórdão a partir da data da sua publicação, em nome de “um interesse público
de excecional relevo” (idem ibidem). Decisão que revela prudência, sensatez e
respeito pelos compromissos assumidos pelo Estado português e pela consequente
prossecução das metas acordadas, num contexto particularmente difícil para o
país em que o incumprimento dos compromissos assumidos externamente levaria
certamente à impossibilidade de responder aos compromissos internos, colocando
em risco salários e pensões ou encargos com juros por falta de liquidez e financiamento.
Pena
é que o partido que assinou o memorando de entendimento em nome de Portugal e
que aceitou as metas de redução do défice aí definidas até 2013 não consiga a
coerência que se espera de uma pessoa de bem para honrar o bom nome de
Portugal. Sim, porque, para além do acesso ao financiamento num contexto de
necessidade, é também uma questão de honra cumprir o que foi acordado. Pedir,
por iniciativa própria, mais tempo constituiria uma outra derrota para
Portugal: a assunção da incapacidade ou da falta de determinação para cumprir
os compromissos. Aceitar uma eventual proposta por parte dos credores é um
cenário bem diferente e que, certamente, agradaria ao país que, desta forma,
salvaguardaria a face. No âmbito de um Programa de Assistência Económica e
Financeira, “pedir” ou “aceitar” mais tempo ou mais dinheiro faz toda a
diferença. O Governo sabe disso e os Portugueses também.
Manuela Tender
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