segunda-feira, 9 de julho de 2012

O Acórdão do Tribunal Constitucional sobre a suspensão dos subsídios de férias e de Natal

O Orçamento de Estado (OE) para 2012 (plasmado na Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro) previa a suspensão, total ou parcial, do pagamento de subsídios de férias e de Natal ou quaisquer prestações correspondentes aos 13.º e/ou 14.º meses para pessoas que auferissem remunerações salariais de entidades públicas ou pensões de reforma ou aposentação através do sistema público de segurança social.
Esta medida era apresentada como excecional e delimitada no tempo: durante o período de vigência do Programa de Assistência Económica e Financeira a que o país está sujeito devido à falta de solvabilidade das contas públicas bem como à incapacidade de o Estado português se financiar no mercado a uma taxa de juro comportável. Esta situação de emergência nacional justificava, no entender do Governo, uma medida que contribuiria significativamente para a redução da despesa do Estado nesta fase de consolidação orçamental. As razões invocadas para justificar a medida já foram suficientemente escrutinadas, concordando ou discordando delas.

Esta e outras medidas de redução da despesa foram acordadas entre o Estado português e as instituições internacionais que o financiam: a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional, vulgo Troika, e visam o cumprimento de metas estabelecidas no que se refere ao controlo do défice e à consolidação orçamental.
Convém também referir que foi o Governo do PS, liderado por José Sócrates, que acordou com a Troika a redução do défice para 4,5% do PIB em 2012 e para 3% em 2013, prevendo poder regressar aos mercados em 2014. Não se entende, por isso, a falta de coerência e a demagogia dos socialistas quando sugerem ao Governo que peça mais tempo para o necessário ajustamento orçamental. Reduzir tão significativamente o défice só pode fazer-se através da redução da despesa ou do aumento das receitas arrecadadas pelo Estado, exigindo sempre esforços aos cidadãos que reconhecidamente já são, para alguns, muito significativos. E o Governo está empenhado em reforçar a credibilidade internacional de um Portugal capaz de honrar os seus compromissos e de, com esforço e determinação, mas também com sacrifício e solidariedade em nome das gerações mais novas, conseguir atingir as metas do défice público acordadas.

É certo que os funcionários públicos reclamavam falta de equidade na distribuição dos sacrifícios. Chamado a pronunciar-se sobre a constitucionalidade da medida, o Tribunal Constitucional considerou que ela violava o princípio da igualdade (consagrado no artigo 13.º da Constituição) pelo que, mesmo reconhecendo “que estamos numa gravíssima situação económico-financeira, em que o cumprimento das metas do défice público estabelecidas nos referidos memorandos de entendimento é importante para garantir a manutenção do financiamento do Estado”, propõe que “tais objetivos devem ser alcançados através de medidas de diminuição de despesa e/ou de aumento de receita que não se traduzam numa distribuição de sacrifícios excessivamente diferenciada” e que haja “equidade e justiça na repartição desses sacrifícios” (In Acórdão 353-2012, de 5 de julho, p. 32).
Atendendo, porém, à necessidade de o país continuar a beneficiar de financiamento externo, o Tribunal Constitucional considera que o cumprimento do valor orçamental de 4,5% do PIB para 2012 se revela, por isso, “um objetivo de excecional interesse público” (idem, p. 33), pelo que, encontrando-se a execução orçamental de 2012 já em fase avançada e por crer que a declaração de inconstitucionalidade, sem mais, poderia levar ao incumprimento das metas fixadas, o que poria em perigo a manutenção do financiamento acordado e a consequente solvabilidade do Estado, o Tribunal Constitucional restringiu os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, passando a aplicar-se a partir de 2013, já que o montante da poupança líquida da despesa pública com esta medida “assume uma dimensão relevante nas contas públicas e no esforço financeiro para se atingir a meta traçada, pelo que dificilmente seria possível, no período que resta até ao final do ano, projetar e executar medidas alternativas que produzissem efeitos ainda em 2012, de modo a pode alcançar-se a meta orçamental traçada” (idem, ibidem).

Na prática, este Acórdão obriga o Governo a redefinir estratégias e medidas conducentes à consolidação orçamental a partir de 2013 que substituam a verba que esperava arrecadar com a suspensão dos subsídios de férias e de Natal da administração pública, mas dispensa o Governo da aplicação da medida inscrita no Acórdão a partir da data da sua publicação, em nome de “um interesse público de excecional relevo” (idem ibidem). Decisão que revela prudência, sensatez e respeito pelos compromissos assumidos pelo Estado português e pela consequente prossecução das metas acordadas, num contexto particularmente difícil para o país em que o incumprimento dos compromissos assumidos externamente levaria certamente à impossibilidade de responder aos compromissos internos, colocando em risco salários e pensões ou encargos com juros por falta de liquidez e financiamento.
Pena é que o partido que assinou o memorando de entendimento em nome de Portugal e que aceitou as metas de redução do défice aí definidas até 2013 não consiga a coerência que se espera de uma pessoa de bem para honrar o bom nome de Portugal. Sim, porque, para além do acesso ao financiamento num contexto de necessidade, é também uma questão de honra cumprir o que foi acordado. Pedir, por iniciativa própria, mais tempo constituiria uma outra derrota para Portugal: a assunção da incapacidade ou da falta de determinação para cumprir os compromissos. Aceitar uma eventual proposta por parte dos credores é um cenário bem diferente e que, certamente, agradaria ao país que, desta forma, salvaguardaria a face. No âmbito de um Programa de Assistência Económica e Financeira, “pedir” ou “aceitar” mais tempo ou mais dinheiro faz toda a diferença. O Governo sabe disso e os Portugueses também.

Manuela Tender

Sem comentários:

Enviar um comentário